Meu campus tem: LiteraPreta — vozes negras em destaque
Conheça o projeto do Campus Ilha Solteira do IFSP que promove pertencimento e reflexão crítica por meio da literatura negra brasileira
Um espaço de pertencimento, resistência e valorização da literatura negra. Nesta edição do “O que é que meu campus tem?”, vamos conhecer o LiteraPreta — grupo de leitura de literatura negra brasileira, projeto de extensão que acontece no Campus Ilha Solteira do Instituto Federal de São Paulo (IFSP).
Com encontros quinzenais, rodas de conversa e debates entusiasmados, o LiteraPreta é um espaço de pertencimento e reflexão crítica para estudantes e toda a comunidade de Ilha Solteira. Mais do que ler livros, os participantes mergulham em histórias que revelam memórias, afetos e desigualdades, trazendo à tona vozes que por muito tempo foram silenciadas.
Coordenado pela professora de Português e Inglês Cíntia Martins Sanches e pelo técnico em Assuntos Educacionais Everton Lessa da Silva o projeto nasceu da vontade de dar destaque à produção literária de autores negros e de aproximar os estudantes de narrativas que dialogam com suas próprias vivências.
A motivação para criar o grupo veio da percepção de que muitos estudantes chegavam à escola sem referências literárias que dialogassem com suas vivências, identidades e territorialidades.
“O LiteraPreta nasceu como um espaço para fortalecer o sentimento de pertencimento, estimular a leitura crítica e aproximar os estudantes de autoras e autores negros que tratam de temas como identidade, afeto, memória, racismo estrutural e desigualdades sociais”, conta Everton.
A professora Cíntia explica que havia interesse em retomar os grupos de leitura já existentes no campus, mas agora com foco em autores negros, trazendo essa produção para uma posição de destaque.
O projeto conta com o apoio do bolsista Willian Gabriel Gomes da Silva, que atua nas mediações, elabora resenhas e cuida das postagens nas redes sociais. Para ele, o que mais marca os encontros é a diversidade de argumentos trazidos pelos participantes, o que tem se encaixado muito bem com a autora que eles estão lendo no momento, Conceição Evaristo: “Isso se encaixa perfeitamente com a autora escolhida e com o debate de suas obras”, afirma William.
Atualmente, o grupo está lendo dois livros da escritora: Becos da Memória e Olhos d’água. Como explica a participante Larissa Freitas Rodrigues, na primeira obra os personagens passam por um processo de desfavelamento, e assim como a escritora diz, é um conjunto de "escrevivências". Já o segundo livro é um conjunto de contos, que consta como leitura preparatória para alguns vestibulares, como o da Unicamp, além de ter recebido o Prêmio Jabuti, uma condecoração de prestígio no país.
Também integrante do Literapreta, o estudante Caio Back dos Santos viu no grupo a chance de retomar o hábito da leitura: “quis conhecer por mim mesmo a autora Conceição Evaristo, sabia que ela é muito importante e suas obras são muito bem vistas pela crítica”.
Tanto Caio quanto Larissa destacam como as obras de Evaristo dialogam com suas visões de mundo. Para ele, as obras ajudaram a combater preconceitos sobre pessoas periféricas e trouxe mais criticidade sobre a estrutura social do Brasil. “ O jeito da escrita dela faz com que venhamos a nos imaginar dentro da história vendo o sofrimento de cada personagem”, destaca a aluna.
Para os coordenadores, a obra de Conceição Evaristo traz uma contribuição única à literatura brasileira contemporânea. Cíntia observa que a “escrevivência” mistura memória e ficção, refletindo uma tendência literária atual.
“Ela transforma a escrita em um gesto político de existência, memória e resistência, revelando experiências de mulheres negras historicamente apagadas pela literatura oficial, dando visibilidade a narrativas marcadas por desigualdades, afetos e ancestralidade”, complementa Everton.
A presença de Olhos d’água em vestibulares como o da Unicamp é vista como essencial, pois amplia repertórios, estimula a leitura crítica e insere autoras negras em espaços de consagração literária. Além disso, a literatura negra contribui para ampliar o cânone nacional ao incorporar novas vozes e perspectivas.
Cíntia lembra que, historicamente, culturas marginalizadas eram retratadas pelo olhar branco e europeu. “Ao longo da história da Literatura tivemos ambientes marginalizados e povos discriminados retratados de fora, pelo ponto de vista branco e europeu. Agora, temos culturas retratadas a partir do ponto de vista de quem faz parte delas”, explica a professora.
O grupo segue engajado para superar os desafios para consolidar o projeto, como garantir livros físicos para todos os participantes e manter o público engajado ao longo dos encontros. Everton destaca ainda a necessidade de uma mediação cuidadosa, capaz de criar um ambiente acolhedor e sensível às diferentes realidades dos estudantes. Com isso, o LiteraPreta vem se firmando como espaço de reconhecimento e construção de sentido, contribuindo inclusive para a permanência escolar no IFSP Campus Ilha Solteira.
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